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moda em tempos de pandemia
Gigi Hadid a desfilar para Jacquemus | Fotografia: Vogue Runway

No meio da pandemia, como é que a indústria da moda se adaptou?

Incerteza e inquietude – são estes os principais conceitos que guiam a indústria da moda durante a pandemia mundial que atravessamos. Mais do que nunca, todos os envolvidos neste universo uniram-se para adotar um sentido de sensibilização e entreajuda que contorne os danos provocados pela Covid-19.

A partir do momento em que o mundo se viu obrigado a respeitar regras que limitaram bastante a nossa rotina, foram muitas as indústrias afetadas negativamente pela pandemia causada pelo novo Coronavírus. No setor da moda, as vendas caíram 34% em março, a produção cessou, as lojas físicas fecharam portas e a reduzida procura levou a uma crise nunca vista no mundo da moda.

Sendo que 80% das compras são efetuadas presencialmente, e ainda que tenham a opção de comprar online, muitos consumidores priorizaram investir em bens essenciais em vez de peças que não seriam úteis para passar a quarentena em casa.

Considerada uma das cinco indústrias mais poluentes do mundo, com uma produção de cerca de 1,2 mil milhões de toneladas de carbono por ano, a pandemia veio facilitar o processo imperativo que é tornar o setor mais sustentável e amigo do ambiente.

Semanas da moda reagendadas e desfiles cancelados

Em fevereiro deste ano, depois de exibidas as coleções outono/inverno para 2020, o British Fashion Council anunciou que a semana de moda seguinte, agendada para setembro, iria ser apresentada exclusivamente através de plataformas digitais para, assim, evitar ajuntamentos e reduzir a possibilidade de contágio.

Seis meses após este comunicado, os responsáveis consideraram a situação estabilizada o suficiente para dividirem os desfiles primavera/verão de Londres entre emissões através da Internet (como Erdem, Victoria Beckham ou Burberry) e espetáculos presenciais com uso de máscara obrigatório (Simone Rocha ou Emilia Wickstead).

No seguimento destas novas medidas, a mesma estratégia foi adotada por mais três capitais: em Nova Iorque, o método escolhido para mostrar as tendências da nova estação foram as livestreams, em Paris optaram por desfiles presenciais (Hermès, Chanel ou Dior) e digitais (Balenciaga ou Givenchy) e Milão seguiu a capital francesa, embora tenha tido mais apresentações ao vivo (Fendi, Dolce & GabbanaVersace ou Valentino) do que transmissões em direto de plataformas digitais (Moschino ou Giorgio Armani).

Quanto à Saint Laurent, uma das maiores marcas de alta costura francesa, o diretor criativo Anthony Vaccarello anunciou a desistência da semana da moda de Paris: “consciente das circunstâncias atípicas em que nos encontramos, a Saint Laurent decidiu seguir o seu próprio ritmo”, lê-se no comunicado oficial.

Ceticismo quanto às novas alternativas face à pandemia

Todos sabemos que, nesta fase, não é aceitável que centenas de marcas e equipas viajem juntas para apresentar uma coleção, no entanto, alguns criadores mostram-se céticos às alternativas propostas e que incentivam a transmissão de desfiles através do digital, alegando que o objetivo de um desfile é a proximidade do público às modelos.

Dono de uma das marcas italianas mais prestigiadas, Giorgio Armani foi o primeiro criador a repensar a estrutura do seu desfile. Consciente de que a pandemia chegaria a Milão aquando a semana de moda da cidade, Armani pediu ao público que não comparecesse ao desfile e assistisse à livestream pelas plataformas digitais.

Com a indústria forçada a reinventar-se rapidamente, Philippe Gaubert, o músico francês responsável pela composição de trilhas sonoras que acompanham os desfiles de várias marcas, expressa as suas dúvidas: “os vídeos em direto que substituem os eventos presenciais podem ser inspiradores e ousados, mas não é o mesmo que ver as roupas na passerelle”.

Como cada peça é criada a pensar no movimento e estrutura teatral que lhe vai conferir caráter e significado, será que uma transmissão online é suficiente para captar essa essência? A resposta é sim – por enquanto, terá de servir.

Podemos trabalhar com a câmara, explorar ângulos, brincar com o styling, música e inovar no cenário. Nem tudo o que funciona ao vivo pode funcionar em vídeo, porém, face à situação que enfrentamos, esta é uma solução viável”

Natalie Kingham, diretora de moda do site Matches Fashion, teme que as transmissões online afetem negativamente as marcas de alta costura: “é importante ser-se flexível e inovador mas, para o comprador, adquirir alguma peça sem antes ver como assenta no corpo da modelo é um risco”.

O propósito das semanas da moda sempre foi interagir com possíveis compradores e grandes empresas e usufruir da propaganda que o evento traz à marca, já que a comunidade do mundo da moda se baseia na troca de ideias e perceção da criatividade por parte dos designers. Assim, Natalie considera que “é difícil para os compradores avaliarem a usabilidade das roupas sem as vemos pessoalmente”.

A propósito da crise financeira que está a afetar a indústria, Philippe Gaubert afirma que está a ser um alerta para nós mas acredito que coisas boas vão surgir disto”. Numa altura em que as marcas decidiram reduzir o número de looks nas suas coleções e apostar em tecidos mais sustentáveis, parece que estamos num bom caminho para acabar com a era do exagero consumista na moda.

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Campanhas fotografadas em casa unem estilo e conforto

Com a impossibilidade de fotografar novas campanhas em estúdios com equipamentos profissionais, algumas marcas associaram-se a modelos para mostrar que, mesmo dentro de casa, é possível ter estilo.

Para além de, em julho, Simon Porte Jacquemus ter sido um dos poucos designers a manter a data do seu desfile, com a devida distância social, e a apresentar-lhes a coleção primavera/verão 2021 da Jacquemus no meio de um campo de trigo, a imaginação do criador não ficou por aqui.

Em abril, Simon usou o Instagram para publicar fotografias da modelo Bella Hadid, da atriz Barbie Ferreira, do ator Arón Piper e da cantora Rosalía a usar roupas e acessórios da marca, numa campanha fotografada através do FaceTime.

As três mulheres vestiram algumas das suas peças preferidas e com que se sentiam mais confortáveis, fizeram uma sessão pela casa e posaram para o telemóvel. O resultado foi uma campanha divertida, sensual e, acima de tudo, descontraída.

Mais recentemente, neste mês de outubro, a Givenchy seguiu o mesmo caminho e escolheu divulgar a nova campanha através do Instagram. Este lookbook é a estreia do criador Matthew Williams para a marca e tem, até agora, 54 outfits usados por celebridades como Naomi Campbell, Kate Moss, Julianne Moore, Laura Dern ou Maria Sharapova.

A caminho de uma indústria mais sustentável

Ao longo dos anos, a moda tem-se reinventado, e um dos maiores exemplos disso é a lenta, mas progressiva, diminuição de produção em massa. Como resultado da pandemia, muitas marcas, não só de alta costura, têm sido forçadas a adaptar a produção às necessidades do cliente.

Muitos consumidores da indústria têm mostrado cada vez mais interesse nas questões de sustentabilidade que envolvem este mundo e estudos indicam que o consumo de fast fashion tem diminuído, já que, gradualmente, as pessoas estão a investir em peças mais sustentáveis.

Outro ponto importante a que as marcas devem ter atenção é o número de coleções que apresentam. Para além dos habituais desfiles de primavera/verão e outono/inverno, alguns criadores alargaram o calendário sem necessidade, o que resulta num maior volume de produção, contribuindo assim para uma indústria menos sustentável.

Poderá a pandemia acabar com a fast fashion?

Porque quando Anna Wintour fala, o mundo ouve. Em entrevista à CNBC, a editora-chefe da Vogue norte-americana reconhece que “a pandemia deu uma oportunidade à indústria para desacelerar, produzir menos e fazer o mundo apaixonar-se pela criatividade em vez do consumo”.

Anna Wintour partilhou as suas expectativas quanto aos efeitos da pandemia a longo prazo e espera que os consumidores apoiem as marcas que mais se preocupam com a sustentabilidade e, ao mesmo tempo, reflitam os nossos próprios valores porque “a moda deve ser duradoura, emocional e significativa”.

Uma das convidadas de Naomi Campell para a rubrica No Filter With Naomi no canal de YouTube da supermodelo, Anna confessa que “esta é uma oportunidade de repensar a logística do setor, refletir sobre o desperdício e alertar os designers para a sustentabilidade e o valor dos materiais que compram”.

Antes da pandemia mundial, já havia uma preocupação por parte dos consumidores no sentido de fazer compras de forma mais consciente. Os mais jovens, principalmente, priorizam a sustentabilidade na moda e os especialistas acreditam que a pandemia só vai intensificar essa forma de pensar.

Um relatório divulgado pela empresa de consultoria empresarial McKinsey & Company provou que a pandemia veio priorizar a sustentabilidade e polarizar as visões em torno do materialismo e do consumo excessivo, concluindo que “isto pode acabar com a fast fashion”.

Quando pensamos em fast fashion, ocorre-nos automaticamente o grupo Inditex, do qual fazem parte a Zara, Pull & Bear, Stradivarius ou Mango. Embora estas lojas estejam a tentar ser mais sustentáveis, a natureza de seu modelo de negócios é produzir roupas de baixo custo e a um elevado ritmo, um conceito totalmente oposto à sustentabilidade.

Porque é que a slow fashion é a solução para um mundo mais sustentável?

Nos Estados Unidos, todos os dias são gastos mais de 300 mil milhões de euros em roupas. Se não forem tomadas medidas prevê-se que, em 2030, o consumo de água pela indústria da moda irá crescer cerca de 50%, a sua pegada de carbono aumentará para 2,7 milhões de toneladas e a quantidade de resíduos poluentes atingirá os 148 milhões de toneladas.

De forma a contornar este enorme dano ambiental, o nosso comportamento enquanto consumidores precisa de mudar. Cabe-nos o dever de fazer escolhas éticas e sobre o que compramos, com base na análise dos custos e benefícios que os nossos atos têm no ambiente.

moda em tempos de pandemia
Impacto da fast fashion no planeta | Fonte: Sustainable Fashion Academy
  • Slow fashion vs fast fashion

Ao contrário da fast fashion – um sistema que usa materiais e mão de obra barata para uma produção em massa que causa grande impacto ambiental, a slow fashion é uma alternativa sustentável no mundo da moda e preza pela diversidade, promove a consciência socioambiental e mantém a sua produção em pequena média escala.

“Slow fashion pode significar comprar em segunda mão ou apoiar marcas pequenas e sustentáveis, tudo depende do consumidor. O importante é que acaba sempre por atender às nossas necessidades”, acrescenta Bridgett Artise, professora de moda na Fashion Institute of Technology.

Como podemos reduzir o nosso impacto na indústria?

Não existe uma fórmula exata para diminuir o nosso consumo nem o tamanho dos nossos armários, no entanto, podemos seguir algumas dicas para o reduzir e torná-lo mais amigo do ambiente.

  • Investir em materiais ecológicos como o linho, lã e algodão orgânico, e evitar tecidos sintéticos como poliéster e nylon que, por terem óleo na sua composição, contaminam a água durante cada lavagem;
  • Comprar em lojas vintage e em segunda mão permite dar uma nova vida às roupas, economizar água, energia, e produtos químicos já gastos anteriormente, para além de serem peças únicas que enriquecem o nosso guarda-roupa;
  • Investir num armário cápsula – uma coleção de peças básicas, mas de qualidade, que podem ser conjugadas de inúmeras formas e têm um maior tempo de duração (como umas calças de ganga, uma malha branca, um casaco bege comprido e umas botas pretas);

Enquanto a fast fashion trata as roupas como algo facilmente substituível, a slow fashion reconhece o seu valor material. Nos dias que correm, cada vez é mais fácil transformar roupas usadas em peças novas ou usá-las simplesmente pelo valor vintage que têm.

No futuro, nem todos se poderão comprar marcas de luxo ou de grupos de produção em massa devido ao custo dos materiais e método de confeção das peças. Pelo elevado investimento monetário e impacto ambiental que a produção em massa implica, é nossa total responsabilidade apoiar uma indústria da moda mais estável, justa e sustentável para o planeta.

O Espalha-Factos deixa-te algumas sugestões de lojas vintage e em segunda mão, onde podes encontrar peças únicas e a valores acessíveis.

Lojas físicas no Porto

Mon Père, Ornitorrinco, Humana Portugal, Retro City e Mão Esquerda

Lojas físicas em Lisboa

Às de Espadas, A Outra Face da Lua, Heartcore Vintage Clothing, Heartcore e Bird On A Wire

Páginas de Instagram que pretendem dar uma nova casa a roupas, calçado e acessórios usados em excelente estado:

Estrela VintageMoody Moon, Back to VintageMEL’S e KINEMA.

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