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André Lourenço
Foto: página oficial de André Lourenço no Facebook

Entrevista a André Lourenço: “sinto que o Footloose é bastante subvalorizado”

A versão portuguesa do musical Footloose chega a Lisboa em junho, pelas mãos do Estúdio de Teatro Musical da Primeiro Acto. O Espalha-Factos falou com o encenador André Lourenço, que nos deu a conhecer um pouco mais sobre o seu percurso, o processo de construção e o que podemos esperar deste espetáculo.

Espalha-Factos (EF): Fala-nos um pouco do teu percurso no teatro musical e da tua relação com a Primeiro Acto. Como surgiu o convite para encenares esta produção?

André Lourenço (AL): O meu percurso em teatro musical começou na Academia de Música de Vilar do Paraíso em 2006 com o musical Disney’s Aladdin Jr.. Foi aí que o bichinho dos musicais começou a tomar conta de mim. Nessa mesma escola fiz o Curso de Teatro Musical certificado pela Mountview Academy of Theatre Arts em Londres, tirei uma licenciatura em Teatro – Variante de Interpretação na ESMAE, no Porto, e concluí uma Pós-Graduação em Teatro Musical no Conservatório Real de Bruxelas.

Fiz a minha primeira produção profissional em 2013, com o musical O Despertar da Primavera em S. João da Madeira, com direcção do Fernando Pinho; em 2014 interpretei Jesus na produção da Contracanto do musical Jesus Cristo Superstar, dirigida pelo António Leal, e atualmente estou em cena com o musical Quase Normal no Teatro da Trindade, produzido pela Artfeist e com direção do Henrique Feist e do Nuno Feist.

Em 2015 surgiu um convite por parte da Sofia de Castro, diretora da Primeiro Acto, para dirigir o Estúdio de Teatro Musical Juvenil da Primeiro Acto, e nesse mesmo ano, encenei o musical 13 de Jason Robert Brown. No ano seguinte, tive a oportunidade de montar uma produção do musical A Pequena Loja dos Horrores. O ETM foi-se modificando, e neste ano deixou de ser somente juvenil. Foi possível criar uma companhia com actores de várias idades, resolvendo assim muitos problemas de atribuição de papéis. Desta forma, achei que era possível fazer um musical que ninguém está à espera que a Primeiro Acto faça.

EF: O que motivou a escolha de Footloose para a apresentação deste ano?

AL: Eu já queria montar uma produção do Footloose há algum tempo. Sinto que muitas vezes o musical “sofre” na comparação com o filme, apesar do marco histórico que foi, e ainda é. O filme de 1984 está muito presente na memória de uma geração ainda activa no nosso mundo, mas a versão de palco (de 1998) não está. Existem várias alterações, existe uma profundidade muito maior e a dificuldade coreográfica e vocal é enorme.

Sinto que o Footloose é bastante subvalorizado; é visto como um “musical onde todos dançam só porque é giro” e que não passa disso. Mas a verdade é que existe muito mais para além da dança. Esta “dança” representa muito mais do que se pensa. Quis mostrar ao público que conhece o Footloose uma perspectiva diferente daquela a que estão habituados. Tudo o que precisava era da oportunidade certa, e este ano proporcionou-se: fazia sentido a escola seguir este caminho e apresentar um desafio maior aos alunos e também ao público.

“O filme de 1984 está muito presente na memória de uma geração ainda activa no nosso mundo, mas a versão de palco (de 1998) não está.”

EF: Como foi feita a adaptação do espetáculo para a versão portuguesa? A história e as músicas mantêm-se fiéis à versão original?

AL: O musical foi integralmente traduzido para português. Esta adaptação foi feita por mim, a Ignez Pereira da Silva, o Rodrigo Dias e o Rogério Maurício. Tudo se mantém fiel à versão original. Só o idioma é que é diferente. Tivemos extremo cuidado a nível de métrica, esquema rimático, mas também a nível fonético (tentámos trazer muitos sons presentes nas letras em inglês para as letras em português, de forma a facilitar a recepção da nossa adaptação e para nos tentarmos manter fiéis ao original, sem nunca desvirtuar o contexto dramatúrgico nem a memória de quem o conhece tão bem).

Mesmo o texto falado, que apesar de parecer mais simples, por vezes não o é: foi necessário adaptar muitas expressões americanas para a nossa língua, resolver certas menções a um contexto sociocultural muito americano… e era preciso que tudo fizesse sentido para um público que não é americano. Foi um trabalho árduo ao longo de três meses, mas que, apesar de duro, nos deu bastante gozo fazer e do qual estamos orgulhosos.

Footloose ETM
Foto: ensaios | divulgação

EF: Podes contar-nos um pouco mais sobre a escolha, formação e o trabalho do elenco?

AL: Este ano fizemos uma “open call” para todos os que estivessem interessados em envolver-se nesta produção (tanto alunos como não-alunos), de modo a dar oportunidade a pessoas exteriores à escola de aproveitar esta experiência e fazer chegar o Teatro Musical e a Primeiro Acto a mais gente. Depois deste processo de audições, o Footloose fechou dois elencos, com um total de 42 pessoas em palco, com idades entre os 12 e os 40 anos.

Ter um elenco tão díspar é bom. Em primeiro lugar, deu-nos oportunidade de atribuir os papéis de forma adequada. Pude atribuir personagens adultas a adultos e personagens mais juvenis a adolescentes. Só este factor já nos faz ganhar muito no que toca a transparecer verdade. O ambiente em ensaios é positivo, sente-se uma vontade grande de levar o Footloose a palco e fazer o melhor. Claro que existe um foco diferente consoante as idades, como seria de esperar num processo de aprendizagem, mas no final todos estamos a remar no mesmo barco. Por outro lado, também me ajuda a perceber que a mensagem passa para todos, tendo um espetro tão grande de idades no elenco. Queremos muito contar esta história da melhor forma possível e prender a atenção do público do início ao fim.

EF: Quem é o público-alvo deste espetáculo?

AL: Penso que seja um espetáculo para todas as idades. A classificação etária é para maiores de 12 porque existem algumas temáticas mais pesadas, mas todos de alguma forma se conseguem identificar com estas personagens. É uma história que apesar de datada continua bastante atual, uma luta por ideais e por aquilo em acreditamos, e até onde nós somos capazes de ir para defender as nossas convicções.

Footloose
Foto: ensaios | divulgação

EF: O que se sente ao dirigir uma versão de um dos mais icónicos musicais de sempre?

AL: Existe sempre uma enorme responsabilidade em querer corresponder às expectativas de todos, e até mesmo superá-las. Gostaria de conseguir criar bons momentos de nostalgia para quem viveu a era Footloose, mas também queria um efeito surpresa para quem nunca viu e não conhece bem. Existe uma imagem um pouco datada, devido ao filme. Mas o musical retrata muitos problemas que, infelizmente, hoje ainda são atuais: a repressão de opinião, de expressão… é um deles. Há uma grande profundidade emocional em todas estas personagens e sem todo esse pano de fundo, nada neste musical faria sentido.

Quero cativar todos os que já conhecem o filme e prender a atenção de quem não conhece. Quero muito deixar a minha marca neste espetáculo. Não conseguiria fazê-lo sem uma excelente equipa: a Marta Mota, responsável pela parte coreográfica do espetáculo, a Ana Marta Kaufmann na assistência de encenação, a Mariana Granate e Madalena Venâncio nos figurinos, o Rogério Maurício na assistência de produção, o Gonçalo Lima, responsável pelo trabalho com as headshots e com muito do material gráfico, e claro está: todo o apoio de produção da Primeiro Acto, na pessoa da Sofia de Castro. Tivemos muitos apoios a nível de cenografia e adereços, destacando o Ginásio Clube Português, a Associação de Patinagem de Lisboa, a Artfeist e JJ Activos. Sem estes apoios, a nossa produção não teria muito do que vai ter. Um sincero obrigado.

“Quero cativar todos os que já conhecem o filme e prender a atenção de quem não conhece.”

Para não perderes

No dia 3 de junho o elenco de Footloose estará presente na FNAC Colombo para uma showcase pelas 16h30. O encenador convida: “podem ouvir algumas músicas em formato concerto, estão convidados a aparecer!”.

André Lourenço
Foto: divulgação

O espetáculo vai estar depois em cena no Auditório do Centro Cultural da Malaposta, nos dias 28 e 29 de junho, às 21h00, e no dia 30, às 16h00 e às 21h00. Os bilhetes estão disponíveis online e nos locais habituais. Podes acompanhar todas as novidades através da página de Facebook e Instagram.

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